quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

parte III - pulsar do amor

tomou assim aruc seu rumo, pois acostumara-se a andar nas correntes do não-tempo - quem assim caminha, sabe sempre para onde ir e está sempre no lugar certo, na hora perfeita, e tudo, absolutamente tudo, se torna eterno e presente.

de seus lábios saia um cantarolar tão sutil que ouvidos agitados não podiam captar, mas que todavia, penetravam as malhas das preocupações humanas, incandescendo moléculas de amor a milhas de distância de seu presentificado semblante. sentiu uma satisfação imensa, e do 'pai de todas as estrelas' veio-lhe uma confirmação certeira de bem proceder. soube, num lugar íntimo dentro de si, que o silêncio seria seu leal parceiro de jornada.

- trabalharei como um radiador de amor e convocarei as microvitas do cosmos para meu auxílio! - formalizou este pensar, num pulsar de clara voz, pois assim se selava um desígnio, como num salmo que termina em 'selah', ou amém.

as microvitas estavam presentes um toda parte, viajavam pelo cosmos no tempo de um instante. deslocavam-se por pura atração. onde um afim se fizesse, alí estavam também elas. muitas eram suas famílias e para cada qual havia uma especialidade. em cada canto do universo, ao serem percebidas, ganhavam nomes variados - anjos, devas, inspiração, musa, milagre, insight, entre outros atributos, graciosos ou não. em seus reinos, microvitas não se descriminavam entre si, cumpriam simplesmente sua natureza mais intrínseca. quando aportam em lugares de realidade relativa e dual, eram percebidas como 'boas ou más'. todavia isso tinha nada haver com sua natureza, era só um modo de perceber parcial. para olhos bons, tudo é bom... enquanto para olhos maus, tudo é mau, ensinou na antiguidade o maior mestre que por aqui transitou.

certa feita, após um grande desentendimento entre as nações da terra que deixara milhares de humanos sem seus corpos de carne, o desagradável odor destes, que sem a presença da vida se decompunham ao relento, atraíra uma família de microvita cuja afinidade com o mau odor era tremenda. tal presença espalhou-se rapidamente pelas quatro direções, alojando-se em corpos vivos, adoecendo-os com uma enfermidade que a ciência da terra não sabe ainda curar.

isto relata somente uma qualidade daquelas inumeráveis famílias de microvita do universo. há, entretanto, microvitas magníficas que acompanham aqueles que entoam os nomes sagrados do 'grande mistério', o criador das galáxias giratórias. elas chegam a fazer cócegas e arrancam risos e choros de alegria daqueles que assim unificam, com cânticos de amor, o centro de suas centelhas individuais ao centro criador de toda a vida.

a urgente chegada de aruc na terra demandou certo tempo de adaptação entre sua natural serenidade e o campo de medo e desconfiança que percebia emanar do pensamento das pessoas. tão logo aquele cântico divino saiu de seus lábios, o amor instaurou-se de imediato em seu centro vital, abrindo seus olhos para ver o invisível. notou então que os pensamentos de medo e desconfiança estavam em todo lugar, e que se tratava de um programa monitorado de aprisionamento coletivo das centelhas divinas da terra. já vira isso antes, não só no planeta azul, em suas idas e vindas, mas também em outras regiões das galáxias onde forças contrárias ao dharma investiam em estratégias ardilosas para desconectar os filhos do grande pai de sua fonte original, e assim embrutecê-los ao ponto da servidão muda, ou da escravidão inconsciente.

o amor compassivo preencheu cada átomo de aruc, e uma força tremenda foi derramada sobre ele, como um óleo de dádivas graciosas que clareou seu entendimento para saber exatamente o que fazer. não se tratava de um plano, pois não era com o futuro que aruc deveria se preocupar; era um estado mágico de presença, que lhe permitia saber sempre o que fazer, como um presente. dirigiu-se então para um local de grande multidão, manteve seus olhos abertos e pacíficos, num caminhar digno de quem anda pelo caminho das estrelas brilhantes do cosmos, e ali, no meio do alvoroço do horário de almoço, cantou em silêncio as canções do amor que brotavam como labaredas do centro de seu peito. tão logo a sinceridade se firmou, legiões de microvita divina formaram um comando de auxílio ao redor de aruc. sem emitir uma única palavra, aruc distribuiu faiscas de amor incandescente para as microvitas. seus olhos miravam através das aparências da multidão, repousando no centro adormecido da morada de deus nas mulheres e nos homens famintos.

onde quer que seus olhos repousassem, microvitas surgiam instantaneamente e plantavam faíscas de amor. um alvoroço silencioso se fez no mundo invisível. ondas de bem-aventurança pulsavam pelo éter, carregadas de amor flamejante. muitos que perdidos em seus pensamentos olhavam para o chão ou para lugar algum, sentiram um calor estranho no coração - era estranho de tão gostoso! outros que se sentiam só, pegaram-se dando boa tarde ou cruzando olhares com as pessoas que nunca são vistas na multidão.

as árvores que habitavam o canteiro central da avenida enfumaçada agitaram-se sem vento e alguns animais aproximaram-se de aruc para presenciar o que há tempos não acontecia naquele lugar. estes pequenos inocentes puseram-se a auxiliar as microvitas, e enchendo-se das faíscas de amor que emanavam da canção silenciosa, andavam e voavam pelas ruas afora como vagalumes discretos sob a luz do sol.

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